Três meninas. Três histórias diferentes que se encontram. Três linhas distintas de pensamento, que se unem formando um maravilhoso mosaico de histórias, ideias e experiências. Encontram-se nas afinidades e completam-se nas diferenças, enlaçando-se nas alegrias e tropeços da vida. Escrevem aqui para celebrar, compartilhar e aprender. Para refletir sobre as experiências do passado, as inquietudes do presente e as incertezas do futuro. Nessa sucessão de encontros e desencontros, buscam entender melhor o mundo. Tudo isso regado por um pouco de geografia, política, arte e muito ziriguidum!

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Polícia desocupa prédio no Centro com gás e tiros de borracha

É para ISSO que serve a POLÍCIA e a POLÍTICA no Brasil... Tortura, violência, repressão, agressão, injustiça, calúnia, difamação, corrupção, autoritarismo, arrogância, crueldade, selvageria, ..., poderia ficar qualificando até amanhã. Mas prefiro publicar a reportagem que saiu no Globo (que para os seus padrões de criticidade "a la classe média tijucana" foi bem ponderada e, na sequência, a carta enviada por um companheiro que foi preso na desocupação. MAIS UM DESPEJO, MAIS UMA OCUPAÇÃO!
RIO - Policias Militares do Batalhão de Choque lançaram gás, spray de pimenta e tiros de borracha para dispersar estudantes, sindicalistas e manifestantes que protestavam em frente a um prédio do INSS, ocupado por sem-teto, na Avenida Mem de Sá, nº 234, no Centro.
O prédio havia sido ocupado por 23 famílias no fim da tarde deste domingo. Alguns manifestantes foram presos e um chegou a ser levado para o hospital com sangramento no pescoço, após ser atingido por um tiro de borracha.
Antes da chegada do Batalhão de Choque, o clima era calmo e os manifestantes estavam em clima pacífico. Há grande confusão no local e aos pouco as famílias que ocupavam o prédio estão sendo retiradas pela polícia. No tumulto muitas crianças, idosos e até uma grávida sofreram com a confusão, muita tosse e irritação nos olhos.
Segue a carta de Pedro:
Gente,
encaminho este email e aproveito para fazer um breve relato sobre o que aconteceu comigo e mais seis companheir@s que foram presos e alvos de tortura ontem tanto por parte da Polícia Federal como da Polícia Militar. Nos reuniremos ainda para escrever uma carta denunciando tudo o que aconteceu, todas as arbitrariedades e desrespeitos aos direitos humanos cometidos pela Polícia à mando do INSS, um dos maiores latifundiários urbanos e que apenas em 2010 promoveu quatro despejos de ocupações sem-teto no centro do Rio, jogando centenas de famílias na rua ao mesmo tempo em que seus imóveis continuam abandonados e servindo à especulação imobiliária, mas, por hora, escrevo este email apressado pra divulgar em parte o que vivemos ontem.

Primeiro, temos que esclarecer a mentira, levada a acusação jurídica, de que o movimento, através de seu "líder" - que a polícia identifica como eu - sequestrei e agredi o segurança com tapas e abuso de força física. Isso é um total absurdo! Nem eu e nem nenhum dos companheiros, dos ocupantes, agredimos o segurança ou o prendemos. Nós entramos no prédio quando a porta estava aberta, logo após a troca dos vigilantes, e num momento em que este conversava com uma pessoa na calçada. Nós apenas conversamos com ele e explicamos a ação, dizendo que o prédio estava agora ocupado por famílias que se organizam no movimento sem-teto e que nós estávamos pleiteando, na justiça, a propriedade do imóvel. Nem nós, nem mesmo o segurança - que era apenas um contra trinta famílias, por isso não reagiu - fomos agressivos e a resolução deste conflito foi rápida e pacífica. Inclusive, nós devolvemos todos os pertences dele, mostrando que não era nossa intenção roubá-lo, nem prendê-lo no prédio. Obviamente, se o prédio estava ocupado não havia sentido deixá-lo lá dentro, inclusive, pois, nesse caso os seguranças costumam alegar "cárcere privado" como forma de derrotar a ação do movimento. Sendo assim, fica clara a tentativa de criminalizar o movimento social, algo que não é brincadeirinha ou jargão de militante, mas que acontece diariamente, acarretando em atos extremamente violentos e inclusive em mortes. Tentativa, é preciso ressaltar, que constrói uma imagem de organização do movimento social totalmente equivocada e que reflete o próprio Estado. Eu não sou líder de movimento algum, como consta na acusação que está sendo encaminhada ao Juiz, nem existe líder que coloca pessoas num prédio ou que sejam os “incitadores da violência”, como também consta na acusação. Os apoios da ocupação nem se quer tem direito a voto nas assembléias de moradores, incentivando e acreditando que o movimento sem-teto tem que ser guiado pelos próprios sem-teto, cabendo a nós, como fizemos ontem, apenas o papel de apoio. Nossa luta é contra o Estado, e pra isso não recorremos da estrutura organizativa, das hierarquias, nem da tortura que este promove. Lutamos pela igualdade e pela democracia direta, não nos espantando, portanto, com a não “compreensão” por parte do Estado de nosso modo de lutar.

Estado, que desde o princípio mostrou-se violento.

Entrando dentro do prédio, ainda que ocupado por crianças, idosos e por uma mulher grávida, tivemos a entrada de alimentos e objetos proibidos, tendo que recorrer a baldes que eram lançados pela janela. Pela polícia, morríamos de fome lá dentro, assim seria melhor. Aliás, não, pois como eles mesmos gostaram de frisar pra mim enquanto eu era levado na viatura e quando invadem as favelas ou matam a população de rua: “nós estamos na polícia porque gostamos de matar”. Então, talvez a morte por fome não saciasse a necessidade de extermínio que eles carregam e que parecia se manifestar muito bem quando agrediram as pessoas que estavam prestando, pacificamente, solidariedade à ocupação e quando lançaram bombas e spray de pimenta para dentro do prédio.

A Polícia, mais uma vez, implementou o terror. Quando arrombou a porta do prédio, sem nenhum tipo de ordem judicial, apenas anunciou que “se não saíssemos agora eles iam quebrar geral, a porra toda”. Saímos como lixo, tratados como bandidos da pior espécie. Tratamento que só se acentuou quando sete pessoas – que eram apoio da ocupação - foram espancadas, presas e jogadas dentro na traseira de uma viatura. Um espaço sem nenhuma ventilação, escuro, apertado, que precisa ser abolido IMEDIATAMENTE e que lembra os porões terríveis dos navios negreiros, escravidão que o Brasil cultiva e exalta. Antes de ser tacado no “camburão”, com apenas uma notificação de que eu estava sendo preso sob a acusação de seqüestro, eu ainda falei que tinha problemas respiratórios e que sofro de claustrofobia, mas parece que isso só os animou. Com o corpo machucado, ardendo com o spray de pimenta, sufocados, ficamos espremidos, praticamente enforcados pela polícia. Sessões de tortura que só prosseguiram quando fomos levados para a Delegacia da Polícia Federal (DPF) e tacados como bichos em duas salas. Sem nenhuma explicação ou qualquer diálogo, obrigaram eu e outro companheiro a tirar toda a roupa, alegando que podíamos ter “uma arma por baixo da cueca”. Piada, se não fosse o contínuo de uma agressão que ainda estava começando, pois a partir daí, perto das 13 horas, ficaríamos SEIS horas largados na cela sem direito a ir ao banheiro, usar celulares, comer, ou receber qualquer informação sobre o nosso caso e destino. Urinávamos em garrafas de dois litros, ao mesmo tempo em que gritávamos de dentro da cela pedindo que alguém abrisse a cadeia e falasse algo, o que só aconteceu com a chegada da nossa advogada e dos advogados da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.

No corredor sujo e fechado, com apenas um ventilador para as duas celas, só começamos a ser recebidos pelo Delegado às 21 horas da noite e o último a sair, no caso eu, saiu apenas as 4 horas da madrugada, após 15 horas de cárcere, prisão, tortura, sofrendo privações e deboches de alguns policiais. No final, ainda tivemos que pagar fiança para não dormir na cadeia.

Não parece excessivo, após contar rapidamente pedaços do que aconteceu ontem, lembrar que tudo isso aconteceu no mesmo dia, 13 de Dezembro, em que os militares anunciaram o AI-5, símbolo e motor da violência e da ditadura militar, defendido tanto pelo Delegado da Polícia Federal como pelos policiais militares que nos travavam como merda dentro da viatura. Denunciar a mentira democrática desse país, tendo total consciência de que no momento em que as lutas populares do campo e da cidade crescerem e que o movimento popular aumentar as suas forças, novos golpes militares surgirão, com ditaduras mais explícitas, só que dessa vez promovidas também por aqueles que um dia foram torturados ao lutar por uma sociedade justa e democrática.

Pois, não temos vergonha nenhuma de dizer – ao risco de sermos considerados “caretas” e “velhacos” - que esta violência é estrutural do Estado e do capitalismo, especialmente à moda brasileira, e que a sociedade comunista, sem classes, sem Estado, com igualdade e liberdade, é o que buscamos e acreditamos como vida e justiça.

Pedro Freire –
Professor de sociologia do Estado

(para ler a notícia publicada no site do Globo, clique aqui  )

5 comentários:

Unknown disse...

Estou "EM CHOQUE !! Com tanta "ORDEM"!!!!
QUANDO É QUE O ESTADO TERÁ VERGONHA DE MANTER SEUS FILHOS NAS RUAS?
FICA ESQUENTANDO OS IMÓVEIS PARA PROMOVER "LICITAÇÕES" E VENDER PARA PARCEIROS DA INICIATIVA PRIVADA DEPOIS DA REVITALIZAÇÃO... OU SERIAM "ILICITAÇÕES"?
POSTADO TB NO FACE BOOK!

Ruth disse...

Postei um comentário e compartilhei no Twiter e Face book.
lamentável e vergonhoso. Poir que isso só o que ouvi ontem de um
famosíssimo patologista da àfrica do Sul que veio ao Brasil por convite
da USP de Piracicaba e foi a UERJ.
Em sua palestra teve muito "orgulho de mostar a "magníficas lesões
bucais dos infelizes Aidéticos da àfrica" Lesões que não mais existem no
mundo!!! e que só existem lá devido a omissos como ele que vivem da
miséria alheia (o infeliz não sabia nem como os pacientes eram
tratados!!!)
Pasme eles só começas a tratar os pacientes quando a contagem de
linfócitos (parametro de progressão da doença) esta abaixo de 200 (isso
ja é estado terminal) aqui se trata com 700 ( ainda não ha sintomas).
Vimos horrores!! Todos ficaram em choque .. As preguntas sobre essas
questões foram respondidas com: A cultura deles permite várias
promiscuidades!! O governo não investe no tratamento!! Eu não sei!!!
EU PERGUNTO ONDE ESTÃO OS DIREITOS HUMANOS NESSE CASO? ELES INTERVIRAM
NO CASO DA ÁDULTERA DO IRÃ! POR QUE NÃO FAZEM ISSO NA ÁFRICA?
EU CONCLUO QUE O DINHEIRO QUE A AIDS RENDE NA ÁFRICA PARA A INDÚSTRIA
FAMACEUTICA TESTAR SEUS REMÉDIOS É INCALCULÁVEL!!!
FICO DEPRIMIDA COM ESSE MUNDO
bjs filhote

Eduardo Costa disse...

"Concordo plenamente professora. Todos que conhecem a chamada "zona cinzenta" do centro do Rio se deparam com o abandono do patrimonio pelos 'proprietarios' e pelo estado. É como diz a constituição "A propriedade devera cumprir sua função social" que é ser OCUPADA."
(Eduardo Costa, pelo Facebook)

Patricia disse...

Alguma coisa está fora da ordem... Há algum tempo por sinal...

E concordo com a Ruth, também estou em "Choque" com tanta "Ordem"!

Renata disse...

Tati, ótimo post. E infelizmente necessário.

É um absurdo que ainda hoje as manifestações, protestos e ocupações sejam tratados dessa maneira. É um absurdo que a polícia tenha esse tipo de atitude.

E é inadmissível que os movimentos sociais sejam criminalizados no Brasil. Essa é uma tendência que já ocorre em outros países aqui nas Américas, e que no Brasil está ganhando força, apesar de um governo nacional mais de esquerda.

A luta por igualdade e justiça social é um direito. Não pode se tornar um crime. Se não, onde vamos parar??